terça-feira, 10 de agosto de 2010

Depois de dois meses: dureza africana (I)

Exactamente dois meses depois de ter chegado sinto que já estou no meu elemento. Já conheço as ruas e os truques da cidade, o nome dos chauffeurs e dos guardas do trabalho, o meu staff já vem ter comigo para me pedir conselhos sobre o que devem fazer e já nem estranho a arquitectura da cidade, a poeira ou o mau estado das estradas. É engraçado como o ser humano se habitua a tudo.. Watu wazoezi yote.

No entanto há coisas que nunca poderei habituar me como a indiferença de certos congoleses para com outros, em particular o tratamento dos meus guardas pela empresa KK Security, e o estatuto das mulheres. Nunca me considerei uma feministra acérrima mas cá é impossível não sofrer com o destino das mulheres congolesas. Sem mencionar as violações sistemáticas pelos rebeldes ou soldados das forças armadas estaduais, no outro dia estava a levar a minha professora de Swahili a casa e a essa hora passa sempre o mesmo programa na radio: um homem a falar alto, tom de zangado, e a mulher sempre a responder com uma voz de medo e meio a chorar. Perguntei a rir porque é que é sempre o mesmo padrão, e aí o chauffeur responde da forma mais natural que, porque a mulher se porta sempre mal, o homem está a castigá-la. Não fiz grande caso porque visto o nível de educação do Baby e conhecendo os africanos, honestamente não esperava outro comentário. O que me sorprendeu foi a naturalidade do comentário  da Véronique, professora de Swahili da Alliance Française e de todos os expatriados de Bukavu: ele está-lhe a bater.
Perguntei: “mas isso é comum?”

– “É”  diz ela, “aqui os homens batem frequentemente nas mulheres.”
- “Frequentemente ou de vez em quando? Quão frequentemente, uma vez por mês?”
- “Sim, uma vez por mês ou mais.”
- “Mas todos batem nas suas mulheres ou tem a ver com o nível de educação e riqueza?”
 - “Todos batem, mais cedo ou mais tarde.” “Kwa heri, Vera. Kwa juma kesho” . “Adeus Vera, até para a semana”, e sai do carro despedindo-se. Na rádio continuo a ouvir a voz da pobre mulher a choramingar.

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